É por isso que falo de quem gosto,
ou no mínimo, de quem tolero. E o assunto de hoje passa longe de figurar em uma
matéria do Discovery channel, meus amigos. Enquanto me dava ao luxo de ter o
direito de resposta a uma questão pessoal, buscava nos arquivos da minha calva
cabeça alguma referência que alimentasse esse folguedo que o ato de escrever
aos domingos se tornou pra mim; qual não foi a minha surpresa quando vi minhas
mãos involuntariamente a digitar de modo sôfrego, como se quisessem fazer algum
tipo de justiça a esse ilustre personagem da minha vida: o meu pai.
Esse cara de quem falarei nas linhas
subsequentes é um sujeito que, nem que eu viva duzentos anos, irei encontrar
alguém similar em caráter, hombridade e amor à família. É bom lembrar o tempo
em que ele, ainda com a vasta cabeleira encaracolada, me carregava em seus
ombros rumo ao futebol semanal. Eu ainda nem fazia ideia do sujeito que viria a
ser um dia, mas os valores do meu velho pai já se haviam entranhado na minha
personalidade pueril; valores que tento carregar comigo e que me ensinam a
viver com um mínimo de sossego.
O maior exemplo que herdei dele foi que “a palavra de um homem é seu maior
patrimônio; uma vez que ela perde o peso, pode-se decretar a sua falência
moral”. E palavra eu sempre tive. Se eu a usei para o bem ou para o mal, só a
minha consciência sabe e só a ela devo satisfações. De gosto musical refinado,
com um sorriso de avô gratuito e para orgulho de toda família, trabalhador,
muito trabalhador.
Quantos natais e anos-novos eu o vi sair de
madrugada para a lida e só voltava de manhãzinha com as orelhas cheias de
minério... Quantas privações passamos juntos em prol de uma vida mais
confortável... Um homem de idéias originais e de muita visão, mas de coração
mole. Adorável em qualquer circunstância, o xodó de minhas ex-namoradas...
O pai sempre foi muito transparente, mas e
quanto ao homem? Esse eu ainda estou descobrindo quem é. Para falar a verdade,
só consegui ter uma vaga noção de quem é este ser humano no dia em que deixei
de ser filho. Essa é mais uma das grandes verdades da vida que combati e que
por fim dobrei os joelhos, derrotado e feliz por não ter tido a razão que
ansiava na juventude.
Gostaria de lhe dizer, meu velho
melhor amigo, que lamento não ter sido mais próximo da sua intimidade o quanto
você merecia. Peço perdão por não ter respeitado seus momentos de ser humano
frágil e, ainda assim, maravilhoso que o senhor é. Queria que soubesse que o
amor filial que sinto pelo senhor nunca morreu, nem mesmo quando cansado, o
senhor se recusou a jogar dominó comigo. Nem mesmo quando contra tudo e contra
todos, ficou ao meu lado em meu momento mais difícil.
Agora, sinto que meu primeiro vôo solo em
direção à minha história é possível e não poderia deixar o senhor de fora dessa
conquista. Mesmo que não nos conheçamos mais. Mesmo que o senhor tenha se
cansado de me amar. Mesmo que seja para tomar a parte que lhe cabe nessa
vitória. Ao menos para que eu possa lhe dizer o quanto eu o amo.
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