sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

CONFISSÕES DE UM COÇA- NOZES


Era só o que me faltava! Estou aqui de frente para o meu moleschine digital, enquanto o mundo desaba em chuva na rua e eu, pra variar, sem absolutamente nada para fazer. Só de pensar que não terei sobre o que dizer em mais um capítulo da minha saga verborrágica, me acelera a queda dos cabelos. Pensei nos meus inimigos, mas não encontrei em nenhum deles um assunto relevante que pudesse figurar em meu colóquio de coçador de saco vespertino. Do meu trabalho, não tenho sobre o que reclamar e pra falar a verdade, em um país como o Brasil, ventilar esse tipo de chorumela eu acho até cafona.

E se não tenho do que reclamar, o que é que eu faço agora com meu tempo ocioso? A rabugice é algo tão inerente à minha pessoa, que ao menor sinal de que as coisas estão andando bem já começo a ficar preocupado. Pode ser que seja o prenúncio de tempos ruins, estes tempos bons. Se o caro amigo e leitor onanista tiver um mínimo de sinapses sadias, irá compreender que para quem é amargo assim como eu, a felicidade é um estorvo. E eu falo, assumo o que digo e explico os porquês de se abominar os alegrinhos.

Pra começar, todo alegrinho ou é meio falso, ou meio burro. Ou não presta atenção à vida. Deve ser uma questão genética, sei lá. Não quero dizer com isso que ser uma pessoa medianamente feliz não tenha os seus méritos. Pelo contrário. Até admiro quem consegue estabelecer um equilíbrio entre as suas emoções e consegue passar a vida inteira fingindo que é normal, mas confesso que essa espécie de gente anda cada vez mais rara de se ver. Junte-se a isto o fato de que todo alegrinho possui uma disposição irritante para a vida, para a festa e o escambau, sem a menor comiseração (vou aproveitar que essa palavrinha está na moda para usá-la da maneira correta) por quem faz do infortúnio o seu modus vivendi. 

E tem outra: os alegrinhos são à prova de ranhetices. E muito obstinados também. Solitário, um rabugento de carteirinha pode até se dar ao luxo de não ter de provar ao mundo o quão profundo ele o é, de viver a vida inteira assim e nem sequer se preocupar com isso, já que a ninguém ele dará oportunidade para uma eventual averiguação. Agora, quando um desses chatos com sorriso automático na cara consegue romper a paliçada que o protege do medo de ser visto como realmente é_ frágil_ e lhe mostra que a vida pode ser tão ou mais interessante que andar com nuvens na cabeça, o estrago já está feito. O ranheta deixa de ser carranca de São Francisco e passa a ser um alegre bonecão do posto. E o melhor: passa a achar graça em tudo. Até na falta do que escrever.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O INFERNO SÃO OS LOUCOS

Descobri que vim ao mundo com defeito de fabricação. Parece que exatamente na hora em que estavam dando os retoques finais no papai aqui, algum anjo preguiçoso teve dor de barriga e, obviamente, foi cuidar das suas coisas, largando-me na podre. O lance é que quanto mais o tempo passa, mais certeza disso eu tenho. Acho que me falta um parafuso, ou me sobra, vai saber!

Confesso já ter ficado bastante aborrecido diante dessa situação, mas hoje até que me divirto com a fama. Pensando bem, não é tão ruim ser taxado de tarja-preta, desde que a alcunha me permita obter um mínimo de paz e tranquilidade. Pra ser bem sincero, nem me abalo mais se, por exemplo, algum amigo me pesa a paciência com as brincadeirinhas que só ele e mais ninguém no mundo acha graça. O que não quero é que as poucas amizades que tenho não saiam arranhadas por uma eventual declaração torta, alimentada pela carência de quem - euzinho - não consegue manter a boca fechada quando se deve.

Afora esses “senões”, não vejo problema nenhum em conquistar notoriedade por imposição da camisa-de-força. Para ser bem sincero, eu acho até bom. Gosto de encarar essas experiências do tempo do pijaminha azul, boas e ruins, como parte integrante da formação do meu caráter e por que não dizer, da vontade divina. Acredito que o “Grande Arquiteto” tenha confiado a mim o inglório dom de saber lidar com ela, a loucura. E se querem saber, a gente se dá muito bem.

Por isso, antes que algum engraçadinho comece a balangar os beiços e dê o seu parecer inoportuno e inapropriado ao meu caso sob o ponto-de-vista da psiquiatria, já deixo bem claro: que vá pra puta - que - pariu. A loucura é minha e ponto final. Não perguntei nada a ninguém...

Sou louco, mas não sou burro, se é o que você quer saber. O suficiente para acordar cedo, trabalhar, pagar as minhas contas e não dever nada a ninguém (este tipo também é chamado por alguns de “malandro”); sou do tipo que ainda acredita na própria profissão, que lê o mesmo livro inúmeras vezes, que jura de pé junto que o Brasil ainda vai ser primeiro mundo ou qualquer outro nome que traduza fielmente este sonhado Status quo. Sou louco de amar a mesma mulher todos os dias e de, ao lado dela, encarar o mundo de frente.

Isso é bem diferente de ser burro. Aliás, coitado, justiça seja feita: de burro, o Burro não tem nada. Ser um quadrúpede das orelhas grandes e outras cositas más não o desabona em nada. Pelo contrário. Ele deveria se chamar “Louco”, ou qualquer outra coisa. Burro no sentido orelha-sequiano é outra coisa. E esse, meu nego, nem comer capim sabe.

ORBITANDO

É curioso o fato de que pessoas com quem dividimos uma vida, de repente passam a fomentar animosidades sem pés nem cabeça, fazendo de nós parias aos olhos da sociedade. A força que move o ódio dessas pessoas, a quem apelidei de “zebras”, poderia ser canalizada para outros fins que não a mais despudorada demonstração de despeito, até então jamais vista por este ávido observador do cotidiano. Essas pessoas fantasiadas de bob esponja são na verdade, lulas-moluscos, enfeitados de bijoux tristes que mascaram a sua solidão e sua insatisfação pessoal tripudiando da vida alheia, ao menor sinal de que as suas não andam segundo as suas determinações. O pior é que elas nem tocam clarinete...

É por isso que falo de quem gosto, ou no mínimo, de quem tolero. E o assunto de hoje passa longe de figurar em uma matéria do Discovery channel, meus amigos. Enquanto me dava ao luxo de ter o direito de resposta a uma questão pessoal, buscava nos arquivos da minha calva cabeça alguma referência que alimentasse esse folguedo que o ato de escrever aos domingos se tornou pra mim; qual não foi a minha surpresa quando vi minhas mãos involuntariamente a digitar de modo sôfrego, como se quisessem fazer algum tipo de justiça a esse ilustre personagem da minha vida: o meu pai.

Esse cara de quem falarei nas linhas subsequentes é um sujeito que, nem que eu viva duzentos anos, irei encontrar alguém similar em caráter, hombridade e amor à família. É bom lembrar o tempo em que ele, ainda com a vasta cabeleira encaracolada, me carregava em seus ombros rumo ao futebol semanal. Eu ainda nem fazia ideia do sujeito que viria a ser um dia, mas os valores do meu velho pai já se haviam entranhado na minha personalidade pueril; valores que tento carregar comigo e que me ensinam a viver com um mínimo de sossego.

O maior exemplo que herdei dele foi que “a palavra de um homem é seu maior patrimônio; uma vez que ela perde o peso, pode-se decretar a sua falência moral”. E palavra eu sempre tive. Se eu a usei para o bem ou para o mal, só a minha consciência sabe e só a ela devo satisfações. De gosto musical refinado, com um sorriso de avô gratuito e para orgulho de toda família, trabalhador, muito trabalhador.

Quantos natais e anos-novos eu o vi sair de madrugada para a lida e só voltava de manhãzinha com as orelhas cheias de minério... Quantas privações passamos juntos em prol de uma vida mais confortável... Um homem de idéias originais e de muita visão, mas de coração mole. Adorável em qualquer circunstância, o xodó de minhas ex-namoradas...

O pai sempre foi muito transparente, mas e quanto ao homem? Esse eu ainda estou descobrindo quem é. Para falar a verdade, só consegui ter uma vaga noção de quem é este ser humano no dia em que deixei de ser filho. Essa é mais uma das grandes verdades da vida que combati e que por fim dobrei os joelhos, derrotado e feliz por não ter tido a razão que ansiava na juventude.

Gostaria de lhe dizer, meu velho melhor amigo, que lamento não ter sido mais próximo da sua intimidade o quanto você merecia. Peço perdão por não ter respeitado seus momentos de ser humano frágil e, ainda assim, maravilhoso que o senhor é. Queria que soubesse que o amor filial que sinto pelo senhor nunca morreu, nem mesmo quando cansado, o senhor se recusou a jogar dominó comigo. Nem mesmo quando contra tudo e contra todos, ficou ao meu lado em meu momento mais difícil.

Agora, sinto que meu primeiro vôo solo em direção à minha história é possível e não poderia deixar o senhor de fora dessa conquista. Mesmo que não nos conheçamos mais. Mesmo que o senhor tenha se cansado de me amar. Mesmo que seja para tomar a parte que lhe cabe nessa vitória. Ao menos para que eu possa lhe dizer o quanto eu o amo.

sábado, 28 de maio de 2011

A longa e sinuosa estrada de um sonho.

Como é estranho e maravilhoso estar enganado de vez em quando, não é mesmo? Poder abandonar, mesmo que momentaneamente a segurança das certezas e aventurar-se rumo ao desconhecido, sem saber o que encontrar, mas com a sensação de que este encontro modificará por completo a sua vida... Algo indescritível, que ainda não foi medido, pesado, talvez até por medo de que um olhar mais atento e desarmado implique na revisão honesta de uma crença até então inabalável, mas que não tem jeito, fatalmente será jogado por terra...

Antes que os poucos leitores que perdem seu tempo lendo esse arremedo de crônica pensem que o cronista que vos fala ficou de coração mole e assumiu um ar solene, aviso que é bem por aí mesmo, e não me faltam motivos pra isso. Afinal, eu vi, ouvi e senti toda energia de estar no mesmo espaço de um Beatle vivo. E pra quem me conhece, sabe o quanto isso é sério pra mim.

Pois é. Eu fui ao Rio de Janeiro e, a despeito de toda a falta de estrutura da cidade maravilhosa em receber a horda de filhos da beatlemania, devo dizer que ainda assim, a casa do Cristo Redentor me surpreendeu. Em primeiro lugar, é meu dever pedir desculpas ao lugar que tão bem me acolheu. As ruas, os taxis, as senhorinhas de cabelos lilases impregnadas de alfazema, com seus brincos e colares de pérola, fizeram -me enxergar bem mais além dos quase trezentos corpos de seres humanos largados aos porcos, na famigerada invasão de um dos complexos residenciais mais violentos do país. O Rio, meus caros, é bem maior que isso. Maior e mais bonito.

Começo a minha odisséia ao desembarcar no Galeão. Quem o conhece sabe que ele fica bem distante do centro da cidade. Por aí, já seria de esperar que o senso comum gritasse mais alto e que a fama de aproveitador de alguns cariocas “espertos” ganhasse corpo. Ledo engano! Enquanto esperava por mais um fã ensandecido que ainda voava os céus da baía da Guanabara, resolvi conhecer gente. Deste fã eu falarei mais adiante. Por ora, atenho-me àquela figura de taxista que tão bem me atendeu. Um autêntico brasileiro, daqueles que trabalha, paga as contas quando pode e surpresa! , honesto.

Perguntado sobre quanto me cobraria pela corrida, respondeu que não queria meu dinheiro, apenas o dele, coitado. Seu nome é Ricardo e fez por merecer ter o seu nome neste relato mambembe. Graças a ele namorei as vias urbanas que só conhecia das novelas, flertei com as placas de sinalização e me encantei ao menos umas três vezes com a vida, que teima em dar as caras no cartão-postal do Brasil.

Já devidamente instalado na casa de um sujeito bonachão e de boa paz (Feijão, meu amigo, não tenho como lhe agradecer!) seguimos à risca o manual da boa convivência entre cariocas: bebemos feito irlandeses. À noite, rumamos para a Lapa, coração da boemia e não por acaso, o ponto de encontro marcado de milhares de seguidores da religião Fab Four. Confesso que há tempos não era tomado por aquele sentimento de comunhão e êxtase, típicos de quem sabe estar a poucas horas de realizar o sonho de uma vida. Fui então invadido pela paz.

Como bom curioso, procurei me informar sobre um local de diversão verdadeiramente carioca, não aquelas atrações feitas para turistas endinheirados, o que definitivamente não era meu caso. Dei de cara com um típico hippie, que me indicou um samba de raiz, com uma cerveja tão gelada quanto possível, e a um preço ridículo, de tão barata. Foi bom, assim consegui abstrair a minha atenção com outra coisa que não o show do dia seguinte.

Por conta da bebedeira, quase não me levantei para o grande dia. Passei mal como há muito tempo não passava. Uma ressaca guerra que catapultou o tampão de minha cabeça à estratosfera quase estraga tudo. Sob o efeito da marvada, cheguei ao cúmulo de dizer que não iria. Graças ao fã do qual falei quatro parágrafos acima (Valeu elegante!) consegui juntar as forças, levantei-me resoluto e me dirigi ao local do show.

Eu poderia aqui desfiar um rosário para descrever a vergonha que nos aguarda para a copa de 2014, mas isso seria tão pequeno diante do que estaria por vir que dei de ombros à miséria dos trens do subúrbio. Tudo me encantava; as pichações, o ninho de fios elétricos que margeia a linha férrea, o trem que carrega tantos brasileiros dentro e fora dele e que mais parece um vagão de carga, repleto de judeus rumo ao forno, e toda pobreza no entorno. Liguei o “foda-se” e fui. Ao descer do trem em Engenho de Dentro (bota dentro nisso!) e escorregar pela rampa que dava acesso ao show, ouvi uma voz familiar.

Se pudesse exemplificar o que senti por dentro ao ouvir aquela voz, seria o equivalente ao tranco que um carro dá quando tentamos dar a partida em quarta marcha. Minha garganta virou o reduto de uma bola de sinuca, a voz embargou, os olhinhos de criança em manhã de natal boiaram em lágrimas e quase enlouqueci. Era o cara. Não teve como não me lembrar daquelas imagens de fãs surtadas dos anos sessenta, chorando como se estivessem diante de Deus, e que tanto condenei e fiz troça. No fim, acabei por fazer o mesmo.

E daí por diante, não parei mais. Foram longas seis horas de espera, e a cabeça não parava de doer. Talvez pela ressaca da noite anterior, talvez pela ansiedade, não sei precisar. Aos poucos, um mar de gente se formou, todos na mesma sintonia, com o sorriso patenteado que só quem esteve lá consegue compreender. Uma observação: Nenhum incidente, grosseria, empurra-empurra. Que platéia educada. Pensei comigo: eles tiveram pai e mãe.

Quando Sir Paul MacCartney entrou minúsculo naquele palco de proporções faraônicas e acenou para a multidão, pensei estar diante de um sonho do qual não queria acordar. Por um momento, quase tive raiva de John Lennon e sua infame declaração de que “o sonho acabou” e me pus a pensar no que ele diria se pudesse ver toda aquela devoção e entusiasmo. Acho que de certa forma, ele viu. “Here Today”, uma homenagem de Paul ao eterno parceiro, deve tê-lo corado de vergonha onde quer que ele esteja, aposto. Ainda mais no trecho da música em que diz: “O que você diria se me visse agora cantando essa música pra você? Talvez dissesse que somos de mundos diferentes, mas ainda assim eu sinto a sua falta.” Ponto para o Paul!

Macca esbanjou, aos sessenta e oito anos, toda a vitalidade, paixão e intensidade que me fez, aos oito anos, pedir de natal meu primeiro disco, o clássico “HELP”. Aos primeiros acordes de “Hello Goodbye”, quem quase pediu socorro fui eu, ainda sem acreditar no que via e ouvia. A sequência foi ainda mais arrebatadora: “Jet”, “Drive my Car”, “Sing the Changes” e muitas outras que, em três horas de culto, marcaram igualmente – talvez com um pouco mais de entusiasmo em “Hey Jude” e “Helter Skelter” - a vida deste fã abobalhado que vos fala.

E finalmente, o Pout- Pourri. Foi aí que me dei conta de que aquelas notas representavam o clímax de uma noite que ficaria guardada na memória para sempre, a minha e a de meu computador. “Sgt. Peppers Reprise” e “The end” foram executadas pelo Sr. MacCartney num tom que eu realmente considero agora como sendo de despedida. Na saída, totalmente em estado narcoléptico, já sem dor de cabeça nenhuma e ainda com cara de quem não acreditava no que havia visto, concluí que poderia morrer tranquilo.

Toda aquela magia me fez perceber que eu deveria engolir toda aquela conversa sobre quem era o melhor do Beatles e coisas que tais. Eu teria pela frente uma tarefa muitíssimo grata e fácil de cumprir. Não vi John Lennon em ação, muito menos George Harrison. Do Ringo, coitado, eu nem falo (Não é mesmo, seu Edu?). Eu sei muito bem o que vi. E tenho plena convicção: ele ainda é Sir Paul MacCartney, o penúltimo dos moicanos, a penúltima cabeça do monstro, uma lenda, um Beatle, o melhor dos quatro. É, amigos, eu tive que engolir esse sapo. E engoli feliz.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Sinceridade, pra variar.

Escrevo como se me livrasse de um tumor maligno. Nessas horas, confesso, não penso em mais nada, não presto atenção em mais nada além da sensação de alívio que sinto ao vomitar na tela brilhante tudo aquilo que me mata aos poucos e que me rouba a vontade de continuar.
Simplesmente escrevo e faço desse momento egoísta um átimo petrificado. Excito-me com a atmosfera erótica que se instala e que se substancia alquimicamente no poder de parar o tempo e de transformar o peso do chumbo que representa toda podridão, mau-caratismo e todo ódio_ que jurei por todos os deuses não mais passar adiante_ em áureo alívio. É uma sensação orgástica e quase tão boa quanto ser o senhor das horas e poder fazer delas o que bem entender. Até mesmo não fazer nada com a consciência tranquila.
Escrevo pra não morrer de tédio ou de excesso de verdade aprisionada nas veias. Escrevo, mesmo sabendo que vivo em uma terra de Citas vestidos de zebras que torcem pra que a mediocridade sempre prevaleça. Para esses, nenhuma vírgula mal empregada, nenhuma mesura, nem mesmo um copo d’água. Não escrevo para vocês. Não mesmo. E não, não se trata de uma questão de ira, recalque ou de algum outro sentimento inferior, mas de dignidade.
Escrevo com a certeza de que o que faço é algo totalmente particular, um inventário de mim mesmo, mas imbuído de uma esperança em estado terminal de que alguém se tenha despido do próprio umbigo, e assim, talvez possa se identificar e vir com os seus olhos embaçados minha tresloucada mania de teimar em existir e em escrever.
Aliás, é preciso que seja assim. Caso contrário, que outro alento eu teria? Do que mais falaria? Não falo de amor, porque esse eu realmente não conheço. Não falo dos outros porque essa tarefa não cabe a mim. Não falo das coisas belas da vida por covardia e medo de torná-las coisas feias. Falo de mim por ser mais fácil, por ser criança e por ter medo daquilo que não posso controlar. Escrevo e falo em primeira pessoa como quem pede socorro.
Sendo assim, admito a culpa; culpa por não ter habilidade alguma em lidar com o paradoxo entre a ânsia de ser compreendido e o fato de estar pouco me lixando pro resto do mundo. Sou réu confesso e assumo: escrevo porque, se falasse, mentiria.