quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Matéria da coluna SV cine - SV Revista Edição Verão. Novembro, 2010.

Quando o diretor Bruce Brown lançou Endless Summer em 1966, fez mais que emudecer espectadores dos sete mares com a clássica cena de abertura, em que um sol de vermelhidão incandescente iluminava toda a sala escura. Sem querer, deu início a uma atividade que afetaria definitivamente aquele ano e todos os anos seguintes: a produção de filmes para o verão.

De lá pra cá a fórmula foi aprimorada e manteve viva a chama e o charme do cinema, que prova estar vivo como nunca e promete esquentar ainda mais a estação. A temporada de lançamentos para as férias já começou a todo vapor e, a julgar pelo que vem por aí, a aposta das gigantes FOX Films e Sony Pictures será nos remakes, que têm se mostrado uma fórmula altamente rentável e não raro, arregimentado hordas de fãs que procuram uma diversão leve e descompromissada às salas de todo o mundo.

O ator norte-americano Jack Black (Escola de Rock, Kung fu Panda), protagonista de produções que oscilam entre a escatologia e o pastelão retorna às telas e estrela a refilmagem de As Viagens de Gulliver, aventura épica baseada no clássico livro do irlandês Johnathan Swift, que relata as peripécias deste viajante e o seu encontro com os diminutos habitantes da fictícia ilha de lilliput.

Por seu turno, Cameron Diaz (As Panteras, Quem vai ficar com Mary?) dará vida à secretária do jornalista Britt Reid (Seth Rogen) em O Besouro Verde. A atriz emprestará sua desenvoltura a esta que será a segunda adaptação em vídeo (a primeira versão foi uma novela de rádio, exibida nos anos 40 do século XX) da famosa série exibida nos anos setenta, imortalizada pela lenda das artes marciais sino-americana Bruce Lee, como o mordomo/fiel escudeiro Kato.

Black e Cameron representam fielmente, cada um a sua maneira, todo o espírito que permeia este gênero cinematográfico que privilegia a ação, diálogos rápidos, muita pirotecnia, sem perder aquela que é a característica mais importante de um filme de férias, sua capacidade de entreter. Ambos são exemplos de medalhões que em breve, brilharão nas telas e farão a alegria de quem trabalhou o ano inteiro, e que agora só quer sossego para curtir junto à família e os amigos bons momentos de distração.

O modo de se fazer filmes, bem ou mal, mudou muito. Felizmente, a força que deles emana não se perdeu com o tempo, e sua a magia ainda tem muito a nos encantar. É por esse motivo que entra ano e sai ano, as salas ficam cheias, o cheirinho da pipoca invade o ambiente e a luz do projetor tremula na escuridão. E nosso amigo, o bom e velho cinema, continua a ser “a maior diversão”.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

F.O.M.E..

Ela acorda com um sorriso de quem acabou de receber flores
Beija-me com a boca desbotada pela noite bem dormida
O que mais poderia eu querer? Dizer não?

Sinto culpa por fazê-la se sentir assim
Tão dona de mim.

A fome, enorme.
O banheiro, pequeno.
Um espasmo de humanidade,
Ou um surto de egoísmo?

Estou sozinho agora.
Sem comer nem comer
Crime e castigo
E tudo por causa de uma botija de gás. Que acabou.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

O Cérbero de Pindorama.

Pra começo de conversa, vamos parar com essa mania besta de escrever bonito. Afinal, pra que enfeitar as “platibandas do burro”, se ninguém de fato lê o que escrevemos? É verdade, podem reparar. Eu sinceramente perdi o encanto e o deslumbre pelas letras muito arrumadinhas à custa de gumex. E sabe por quê? Porque ninguém está nem aí! E se quem lê não liga a mínima, eu é que vou ligar?

Eu assumo. Esta crônica é na verdade, um desabafo rancoroso de quem não sabe nem para onde atira e muito menos qual é o alvo de tal ódio. Queria poder dar nomes aos bois e listá-los por ordem de prioridades, mas não sei nem por onde começo. E a voz.... a voz.... essa maldita voz da consciência que me perturba e que me impele a escrever, mesmo sem um assunto na ponta da pena que o valha. Essa maldita voz que me empurra na direção do abandono, da desesperança e da solidão, meus fiéis companheiros; a mesma voz que ora me levanta nas alturas em júbilo obsceno, ora me atira às profundezas da mesquinharia.

É, você tem razão, eu sou um burro. E não me refiro ao falante da história bíblica nem o da obra de Monteiro Lobato.
Sou uma besta prestes a jogar fora uma preciosa fatia do meu tempo na confecção desta coletânea de abobrinhas, na vã tentativa de me tornar um escritor pior e assim, ter do que reclamar. Tenho comido de menos e fumado demais, sem achar graça nenhuma na vida e com a nebulosa certeza de que sou um caso perdido. Por isso é que escrevo. Se eu fosse realmente esse "cara valente" que acreditei que fosse a vida inteira, teria feito como Hemingway. Ele foi mais corajoso, não é verdade?

Como não disponho nem de uma carabina e nem de colhões para tanto, resigno-me à situação e toco a minha vidinha sem graça sem lirismos, nem conversa fiada. A vidinha de um cara que escreve e nada mais. Um frustrado que ninguém conhece, mas que teima em ser o seu anônimo íntimo. Sei, sei que é assustador e invasivo, mas o que há de se fazer? Continuar com medo? Logo da minha persona de Cérbero? Relaxe. É só uma fantasiazinha que não mete medo em ninguém. Afinal, as únicas portas que guardo são as do meu inferninho particular. Aquele que ninguém lê.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Tiro no pé.

Não sei se de carona na razão ou na rasura me aboleto. De tanto apanhar loucura emprestada dos outros, caí na esparrela de botar na caixa de miolos a ideia mais fixa que Corega em boca de banguelo de levar essa vidinha classe mediana ilhoa e aculturada a sério. Eu bem que fiz um esforcinho, mas o meu bucho não teve talento pra digerir essa pachequice toda.
O negócio é que aprendi que, quando se fala em produção cultural na muralha verde, que é de onde menos se espera, não sai nada mesmo. Não adianta dizer ou fazer aquilo em que se acredita e pensar que algum cacique azedo não vá meter o pau e balangar o beiço em desaprovação. Fazer e transmitir cultura nesta terra de botocudos de All-Star é coisa pra maluco ou desavisado, e ai de quem pensar o contrário.
“Ah, mas temos tantas manifestações culturais que estão em evidência”, diriam alguns... Os mesmos que ocupam lugares privilegiados ou que de alguma forma se beneficiam das manobras desastrosas e/ou mal-intencionadas das secretarias responsáveis pela organização, e por que não dizer, da devoção burra e preguiçosa ao mais do mesmo. Fala sério! Vamos diversificar, cambada! É preciso ceder para conquistar. E eu não to falando do “puder”, não. Dar passagem ao novo e verdadeiramente bom é o mais importante.
Eu, por meu turno, faço a minha parte. Sei que isso parece discurso de quem está por fora da mamata e admito que provavelmente seja isto mesmo. Reconheço solenemente a minha ruindade fonética, semântica e estilística, ao mesmo tempo em que assumo a minha inaptidão em lidar com o teor de canalhice dos que não se assumem como porqueiras e se agarram desesperados feito carcará nos bagos de quem decide os rumos do que é produzido e veiculado por aqui.
Fazer isso é mole, não vejo problema nenhum. Aliás, nem tenho a falsa pretensão de acreditar que alguém possa se comover e afogar as meninas dos olhos se, por acaso, essa minha brabeza de Coronel Ponciano traduzida para o português, com acordo ortográfico e tudo mais cair em suas mãos incautas. Eu, pelo menos, dou a cara pra bater e não ganho nada pra isso. Tem gente que ganha pra isso e dá outra coisa pra bater ao invés da cara...
É imperativo refrescar corretamente as bandas do predicado nadegal e dar lugar a quem quer usar a cabecinha fervilhante de ideias com algo que realmente valha a pena ser transmitido de uma geração à outra. Cultura é isso, amigos. Levada ao pé do Aurélio é o processo ou estado de desenvolvimento social de um grupo, um povo, uma nação, que resulta do aprimoramento de seus valores, instituições, criações e o escambau. Há de ser assim, meus caros. Caso contrário, a nossa culturinha morre de fome. Tá na hora de efetivamente se construir uma identidade cultural e artística capixaba, abafada durante tantos anos e que agora ousa em por as mangas de fora ao questionar a eficácia do binômio panela de barro/congo.
Dói-me o cocuruto saber que por aí está coalhado de gente talentosa, com vontade de fazer a diferença e ensinar a barbudos, falsos cabeças e purpurinados platicéfalos engessados pela burrocracia que a cultura salva, e mais de uma vez.
Agora, o que me derruba os cabelos de verdade é saber que ninguém vai sequer se dar ao trabalho de levar a sério essas sandices que acabo de escrever. É mais um exemplo de produção, cultural ou não, natimorto. Bom, pelo menos houve esforço. É assim mesmo, cada um mostra o que tem. Quem não tem nada de bom, mostra o que pode. Quanto a mim, só me restou mostrar a cara-de-pau e o bolso vazio.

Tratado sobre a amizade.

Somos animais que se relacionam norteados pela premissa básica da proteção que um grupo maior oferece, e esse grupo é definido não pelas qualidades individuais, mas pelo nível de fluidez e afinidade dos nossos desvios de caráter. Ou seja, o artifício desenvolvido pelo Homo Sapiens para assegurar a paz e a boa con (veniência) vivência entre seus pares nada mais é que a sua tendência a ser canalha. A começar por este que tecla.

A velhacaria impera nesse mundão de meu Deus. O engraçado é que alguns tipos de safadagem encontram coro em uma costela igualmente pilantra e, quando isso acontece, o dito adjetivo muda de mala e cuia para outro ramo lexical. O sem-vergonha passa a ser “uma figura”. Aí, tudo vira festa, e tome mais uma gelada, vanja vai, vanja vem, o infeliz canta a sua senhora, você finge que não viu pra não se aborrecer e pronto.

Da cabecinha ressentida da falta de aditivos do papai aqui escapolem considerações a respeito dos motivos que levam quem não vale a merda que o gato enterra a fazer o que faz. Quase sempre o cabra se faz valer do fato de ser o mais divertido da turma, o piadista, o bonitão ou tudo no mesmo pacote. O ponto G da questão é que o pobre coitado do certinho, aquele, o fodidinho, que anda na risca de giz da vida com um mínimo de retidão, invariavelmente se nega solenemente a aceitá-lo como mais novo melhor amigo_ por ver em seus olhos uma pá de más-intenções_ e acaba por encontrar uma pedra no caminho: o rótulo de chato.

E o “título de nobreza” pega pra valer, ainda mais se o Caxias em questão for um cara desprovido de estratégia. Para o danado, tudo no fiofó. Nada de novos amores ou novos ódios, nada de ideias frescas com a vocação inata pra fazer o babaca mais próximo arreganhar os dentes. Pra poder brigar com o pé-de-malvadeza em questão, é preciso muito conhecimento acerca da personalidade das demais “figuras” com quem você e o palhaço dividem a mesa no boteco, a alcova ou o papo de uma sala de espera qualquer. Pra começo de conversa, é imperativo fazer um exame de consciência e se fazer a seguinte pergunta: quais são os critérios usados na escolha dos seus amigos?

E eu respondo que se você se pautou pela simpatia ou pela empatia, se lascou, meu caro. O que realmente solidifica uma amizade, seja ela verdadeira ou não, não é exatamente uma ou outra virtude, que isso até uma zebra está cheia. O que conta de verdade é o quanto você é capaz de suportar o teor de canalhice do outro. Seja por conveniência, solidão ou, principalmente falta do que fazer. Não importa o motivo, desde que ao lado de outro igualmente sem-vergonha você seja a maioria. É isso ou pedir penico e viver só. Mas sejamos sinceros: Há penico pra todo mundo?

segunda-feira, 5 de abril de 2010

A caixa aberta.

As escadas pintadas de vermelhão e o velho barraco de madeira cuidadosamente pincelado com azul figuram entre as maiores lembranças da minha infância de moleque barrigudo. Não sei se me recordo dessa época por influência de uma foto já amarelecida pelo tempo_ em que apareço de shorts na cor grená empunhando um sabre do meu tio que foi cadete em Barro Branco _ ou pela absurda capacidade de retenção desta minha prodigiosa memória. O fato é que, pela primeira vez, tenho coragem de perder meu tempo falando sobre isso. Acho que é, de fato, a minha grande recordação e, simultaneamente, a primeira e a última vez em que me dei conta de que era gente. Um pingo, mas inegavelmente gente.Ao leitor, digo “calma”, pois não embarcarei em uma espécie de “lira dos vinte anos”, até porque acho Álvares de Azevedo um chato de galochas que não tinha mais o que fazer. Que me perdoem os acadêmicos, os poetas bissextos e todo mundo que se mete à besta de escrever pelo meu comportamento belicoso de cronista temporão, mas é meu dever alertá-los de que não dou a mínima pra vocês. Falarei sobre o que me rodeia e se não lhes interessar, o problema é de vocês.Lembro-me do dia em que tomei um daqueles tombos de bicicleta que ficam para sempre na lembrança e na pele. Não poderia ser de outra forma, afinal, trinquei um dente da frente e até hoje me culpo por um dia ter sido criança. Hoje, ao me ver com certo distanciamento, posso afirmar sem o menor medo que fui o único responsável por aquela queda, que mais se pareceu com uma aterrissagem mal-sucedida de um avião sem trem de pouso e com pista molhada. Foi um alvoroço danado: pessoas correram de lá pra cá em meu auxílio, dona Zezé, aquela que supostamente dera um osso de galinha à minha cadela de estimação e não satisfeita com a grande merda feita, presenteara a minha querida pulguenta com uma passagem só de ida para a terra das patas juntas, largou o que estava fazendo pra me acudir. Por isso, merece um desconto. Ainda por cima, fui obrigado a presenciar meus pais se culparem mutuamente pela falta de responsabilidade um do outro. Eu até que gostava da negligência compulsória dos dois quando guri. Era mais fácil ser livre pra aprontar naquela época, já que os dois davam duro, cada um em sua respectiva função e não tinham de fato muito tempo para ficarem de olho aberto em mim.Como buscasse remédio de vida, minha família se mudara para um prédio em frente ao Parque Moscoso, o que havia de mais bonito e moderno em termos de casas encaixotadas e sobrepostas da época. Engraçado, só agora me dou conta de algo para o qual não havia atentado até então: quando guri achava que o velho Moscoso era o maior parque do mundo. Eu devia ter entre seis e sete anos. Com essa mudança geográfica, morria o moleque de pernas ruças e poeirentas e em seu lugar, surgia o menino_ colecionador de playmobil e figurinhas do álbum “Selos de todo o Mundo”_ que um dia iria escrever suas idiossincrasias em uma tela que brilha e serve como simulacro de máquina de datilografar. Confesso que não sei até hoje quem é esse outro garoto, pois ele raramente aparece para mim e há tempos anda sumido.Até pouco tempo atrás eu acompanhei as suas peripécias. Soube que se mudou para o que é hoje o maior bairro de Vitória e lá, aos oito anos, conheceu aqueles que vieram a ser os seus grandes comparsas de traquinagem e de matinês na extinta boate Zoom. Lá ele cresceu, aprendeu sobre as “coisas do mundo”, como a sua avó paterna e evangélica costumava se referir ao que realmente interessa a um garoto imberbe e pré-púbere (Nem sei se essa palavra existe!), ou seja: meninas, meninas e meninas. É claro que nem sempre ele lograva êxito, no que aproveitava para preencher o tempo ocioso ouvindo os discos de vinil dos Beatles, outra grande paixão sua. Soube também que esse menino tornou-se um homem, conheceu uma pequena, apaixonou-se, sofreu, caiu e por amor se levantou. Dizem por aí que até pai ele é.Aproveito para dizer, menino, caso você esteja me lendo agora, que gostaria de saber mais notícias suas. Sinto falta das nossas conversas, lembra-se? Eu e você na maior cara-de-pau a cantar Nowhere Man de frente para o espelho. Meu Deus, que farra! Sinto às vezes uma vontade irrefreável de sair à sua procura e repetir esses momentos tão nostálgicos e felizes, mas não sei por onde você anda. Por mais que eu procure, não te encontro. Tenho medo de que você talvez tenha se enchido de mim e fugido para nunca mais voltar em direção ao labirinto escuro que se chama Eu.